Agora, saindo um pouco da defensiva, gostaria de fazer o tópico andar um pouco mais. Para tal, deixaria aqui comentários a respeito de algumas passagens que eu creio confirmar a Trindade. Segue abaixo:
(1) Jo 8.58 e Ex 3.14.
YHWH significa “Eu sou o que sou” de Ex 3.14, ou ainda, “Eu serei o que serei”. Vem do verbo hebraico hayah, que significa “ser, estar, existir, tornar-se” e “acontecer”. Muitos eruditos hebraístas admitem que este verbo, em Êxodo 3.14, está no binyan hiph’il, nesse caso as formas do presente e do futuro seriam iguais. Isso explicaria o fato de os rabinos não usarem o futuro na Septuaginta. Assim, a expressão hebraica “ehyeh asher ehyeh” traduzida por “Eu Sou o que Sou”, em nossas versões da Bíblia, é gramaticalmente correta.
O significado desse verbo, na passagem de Êxodo 3.14, é que Deus é o que tem existência própria, existe por si mesmo. É o imutável; a causa de todas as coisas; auto-existente, o Eterno; tanto que até hoje os judeus religiosos preferem chamá-lo de O ETERNO.
Assim, quando Jesus declara: “antes que Abraão existisse, EU SOU”, ele está declarando que é Eterno, isto é, que existe desde sempre, e claramente identificando-se com o “Eu sou” de Êxodo 3.14: “Eu sou me enviou a vós”. As provas de que Jesus realmente se identificou com o “Eu sou” de Êxodo 3.14, e portanto declarou-se eterno, são as seguintes:
Primeira prova: Os fariseus, ao ouvirem Jesus declarar: “antes que Abraão existisse, Eu sou”, tentaram apedrejá-lo. A lei ordenava aos judeus o apedrejamento de uma pessoa em cinco casos: (1) Invocação de mortos (Lv 20.27). (2) Blasfêmia (Lv 24.10-13). (3) Falsa profecia (Dt 13.5-10). (4) Filhos rebeldes (Dt 21.8-21). (5) Adultério ou estupro (Lv 20.10; Dt 22.22-24). No caso de Jo 8.58, é evidente que os fariseus entenderam o que Jesus disse, mas não aceitando que Jesus é Eterno, que é Deus, acharam que Jesus blasfemava, e daí tentaram apedrejá-lo.
Segunda prova: Em Isaías 43.13 há uma declaração paralela à de Jesus em Jo 8.58. Deus diz: “Antes que houvesse dia, Eu sou”. O que Deus quis dizer com isto nada mais é que Ele existe antes do tempo, ou seja, Ele é eterno. É inevitável o paralelo dessa passagem com a expressão de Jesus: “antes que Abraão existisse, Eu sou”, principalmente examinando o que acontece depois: a tentativa dos fariseus de apedrejar Jesus. Certamente os fariseus conheciam bem os textos de Êxodo 3.14 e Isaías 43.13, e portanto entenderam perfeitamente que Jesus estava se declarando Eterno, e portanto, declarando-se Deus.
Alguns refutam esta interpretação alegando que em Jo 8.24, no mesmo discurso, Jesus diz aos fariseus: “Se não crerdes que Eu sou, morrereis nos vossos pecados”, e que mesmo após Jesus dizer isso, os fariseus não tentaram apedrejá-lo, portanto não entendiam a expressão “Eu sou” como sendo uma declaração de Eternidade ou Divindade, por parte de Jesus. Mas o texto Jo 8.24 é explicado pelo versículo 23, no qual Jesus diz: “vós sois de baixo, Eu sou de cima; vós sois deste mundo, Eu não sou deste mundo”, ou seja, no versículo 24 o que Jesus quis dizer foi: “se não crerdes que Eu sou [de cima – e não deste mundo], morrereis nos vossos pecados”. Em face à esta declaração de Jesus sobre ser de cima, os fariseus perguntam-lhe: “quem és tu” (v.25), ao que Jesus responde-os: “isto mesmo que desde o princípio vos disse”, ou seja, o Filho de Deus. Fica explicado então o porque de não ter havido ataque à Jesus após o que Ele disse no versículo 24 – os fariseus não entenderam o que Jesus quis dizer nos versículos 24 e 25, e isto é confirmado pelos versículos 26 e 27.
No entanto, o contexto de Jo 8.58, onde Jesus diz: “antes que Abraão existisse, Eu sou”, nos revela uma situação diferente. Jesus havia dito que Abraão viu o seu dia (v.56). Os judeus perguntam: “não tens cinquenta anos e viste a Abraão?” (v.57). Repare que a discussão aqui não é sobre a idade de Jesus nem tão pouco a de Abrão. A questão que os fariseus levantam no versículo 57 é: “como você pode ter visto Abraão, se você não estava lá no tempo dele?”. Jesus, fazendo bem a leitura da pergunta dos fariseus, responde firmemente: “Antes que Abraão existisse, Eu sou”, ou seja, Jesus acabara de declarar que Ele existe antes de Abraão, e isto porque é Eterno, que é o real significado da expressão “Eu sou”, neste contexto. É uma alusão clara à Ex 3.14 onde Deus se declara o “Eu sou”, o Eterno, e também lembra Isaías 43.13. Como já foi dito, é por isso que o versículo 59 nos mostra a reação dos judeus, os quais fazendo bem a leitura do que Jesus acabara de dizer, tentam apedrejá-lo, ao acharem que Jesus blasfemava por, indevidamente (ao ver dos fariseus) se fazer Eterno, ou seja, se fazer Deus.
(2) Jo 10.30.
Alguns tentam reduzir isto para “um em propósito” e citam Jo 17.21 como fundamento. Mas o contexto de Jo 10.30 não permite. Nos versículos anteriores, Jesus dá a entender que a mão poderosa do Pai, a qual guarda as ovelhas, é a sua própria mão, da qual ninguém arrebata as ovelhas: “As minhas ovelhas ouvem a minha voz... e ninguém as arrebatará da minha mão... e ninguém pode arrebatá-las da mão de meu Pai”. (Jo 10.27-29). É logo em seguida (v.30) que Jesus declara: “Eu e o Pai somos um”. Os fariseus fizeram bem a leitura, e entenderam que Jesus estava se fazendo Deus: “Os judeus pegaram então outra vez em pedras para o apedrejar. Respondeu-lhes Jesus: Tenho-vos mostrado muitas obras boas procedentes de meu Pai; por qual destas obras me apedrejais? Os judeus responderam, dizendo-lhe: Não te apedrejamos por alguma obra boa, mas pela blasfêmia; porque, sendo tu homem, te fazes Deus a ti mesmo” (vs. 31-33). Ao contrário do que alguns dizem, Jesus não nega que se fez Deus, nos versículos que se seguem: “Respondeu-lhes Jesus: Não está escrito na vossa lei: Eu disse: Sois deuses? Pois, se a lei chamou deuses àqueles a quem a palavra de Deus foi dirigida (e a Escritura não pode ser anulada), aquele a quem o Pai santificou, e enviou ao mundo, vós dizeis: Blasfemas, porque disse: Sou Filho de Deus?” (vs. 34-36). O argumento de Jesus aqui não é que Ele disse ser apenas Filho de Deus, porém não Deus. Pelo contrário, o argumento é que sua reivindicação de Divindade juntamente com o Pai (v.30) não pode ser considerada blasfêmia justamente pelo fato de Ele ser o próprio Filho de Deus, e portanto, igual a Deus (comp. Jo 5.18). Mas a discussão de Jesus com os fariseus ainda não termina aqui. Jesus continua: “Se não faço as obras de meu Pai, não me acrediteis. Mas, se as faço, e não credes em mim, crede nas obras; para que conheçais e acrediteis que o Pai está em mim e eu nele” (vs. 37-38). A sentença: “o Pai está em mim e eu nele” também é entendida como se igualar ao Pai. Outra vez então os fariseus tentam prender Jesus, injustamente, por interpretarem que mais uma vez Ele blasfema: ”Procuravam, pois, prendê-lo outra vez, mas ele escapou-se de suas mãos” (v.39). Portanto, sem nenhuma dúvida a passagem atesta a Divindade de Jesus.
(3)Ap 2.23, a onisciência de Jesus.
Ap 2.23, “E ferirei de morte a seus filhos, e todas as igrejas saberão que eu sou aquele que sonda as mentes e os corações. E darei a cada um de vós segundo as vossas obras”.
Jo 2.24-25, “Mas o próprio Jesus não confiava neles, porque a todos conhecia, e não necessitava que alguém testificasse do homem, porque Ele bem sabia o que havia no homem”.
Por essas duas passagens concluímos que Jesus sabe o que os homens pensam e sentem; Ele os conhece no seu mais íntimo. Agora vamos comparar com 1Reis 8.39: “Ouve tu então nos céus, assento da tua habitação, e perdoa, e age, e dá a cada um conforme a todos os seus caminhos, e segundo vires o seu coração, porque só tu conheces o coração de todos os filhos dos homens”. Esta é uma oração de Salomão a Deus. Juntando essas três passagens que acabamos de ler, temos a prova de que Jesus é Onisciente e de que é Deus, porque só Deus pode conhecer os corações dos homens, como vimos. Agora releia Ap 22.23 e compare com Jr 17.10: “Eu, YHWH, esquadrinho o coração e provo os corações; e isto para dar a cada um segundo os seus caminhos e segundo o fruto das suas ações.” Não deixe de comparar também com Sl 139.23, que diz: “Sonda-me, ó Deus, conhece o meu coração. Prova-me, e conhece os meus pensamentos”. Bem, não resta dúvida ao compararmos AP 2.23 com Jr 17.10. Jesus Cristo é o Deus que sonda as mentes e os corações para recompensar a cada um segundo suas obras. Mas apesar de não restarem dúvidas, confirmemos a onisciência do Senhor Jesus, em Colossenses 2.3, que diz: “Em quem estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e da ciência”. Se Ele é onisciente, é Deus.
(4) Cristo, o Senhor da glória.
Sl 24.10, “Quem é este Rei da glória? YHWH dos exércitos; Ele é o Rei da glória”.
1Co 2.8, “...porque se conhecessem, nunca crucificariam ao Senhor da glória”.
A expressão “Rei da glória” mostra que não há ninguém que tenha maior glória que YHWH. O Senhor da glória é evidentemente Cristo, pois se fala de alguém que fora crucificado. Desta forma, Cristo é YHWH, pois Cristo é mostrado como sendo o Senhor da glória, ou seja, ninguém tem maior glória do que Ele. Esta é a única forma de harmonizar as passagens – Cristo é o Senhor da glória porque é YHWH, o Rei da glória. Pai e Filho são uma só Divindade – é o que mostram as passagens acima, em paralelo.